Assassinando Lolita
Eu não estou ficando mais nova. Pensava, encostando os dedos nos lábios. Vitor com o gato branco no colo observava preocupado.
Eu não estou ficando mais nova – gritou.
Finalmente... eu já estava preocupado pensando que você estava com algum problema sério. Então é isso? – Vitor sorri para Lorena. O gato levanta do colo de Vítor e começa a andar pelo encosto do sofá.
Lorena pega o velho violão.
Larga isso, nem sabe tocar – Vitor sorri novamente, passando o braço pelo pescoço da mulher, numa tentativa de suprimir a névoa de pensamentos pífios. Suprimir... era isso que ele queria. Eliminar os pensamentos da sua mulher, que ele julgava ordinários.
O que eu vou falar precisa de trilha sonora – diz Lorena dedilhando o violão. Eu já não posso fazer o que quero, não posso tentar sem conseguir... A vida não é complexa como eu pensava... a vida é bastante cruel... Olha pra mim eu não tenho mais condições. Não posso mais seguir.
O que você não consegue é fazer um acorde direito... Vai ser sempre a minha heroína. A minha astronauta... Ontem mesmo queria montar um foguete e hoje não quer mais nada . Você é a minha heroína, não tem jeito – fala Vítor com um tom triste. E se você quiser desaparecer, vou ter que ir junto, não dá pra não te seguir. Ele engole seco, pensando que a vida era cruel, de fato.
Não posso te dar mais nada. Não quero fazer mais nada por você. Você precisa ir embora – Lorena continua puxando as cordas do violão. Não pensa nas notas, só no barulho das cordas de aço batendo nas trastes de metal. Vítor, vai embora... por favor.
Sobre quem eu vou escrever? E o gato é meu, você vai ficar sem ele, viu? – Vítor responde com meio sorriso nos lábios.
Você vai escrever sobre aquela menina que você nunca deixou de gostar e que não sou eu... de repente, até fique com ela. Pensa: vocês podem tomar água de coco na praia... não é esse o seu ideal romântico? – Lorena toca a marcha fúnebre sarcasticamente ...
Desisti do meu ideal romântico quando te conheci, Lorena. Você não é exatamente a Julieta... nem a Lolita – Vítor começa a ficar nervoso.
É disso que estou falando, não estou ficando mais jovem. Você tem que ir embora... viver com a porra da Lolita – Lorena fica olhando o violão, tira o pó que estava nas tarraxas com a barra do vestido preto.
O violão é meu e o gato também – Vítor levanta do sofá e caminha para a cozinha, a procura do gato.
Lorena não se mexe. O gato foge para o quarto. O celular de Vítor toca.
Oi, já estou indo sim...eu estava bebendo sozinho... Já estou indo pra lá, não precisa vir me buscar não – Vítor desliga o celular.
Lorena volta a dedilhar o violão. Pega as suas coisas e vai embora, Vítor – pede Lorena de maneira calma.
O gato não quer ir... fica com ele, outro dia venho buscar e a gente conversa - Vítor abre a porta e desce a escada.
Do terceiro andar, Lorena joga o violão pela janela.
Vítor morre sem encontrar a Lolita. O gato fica com Lorena.
Fè Coelho
Enviado por Fè Coelho em 28/12/2024